Ética e Liderança

O entendimento da ética em um ambiente corporativo é fundamental.
Nossas ações na prática do trabalho provocam repercussões nos demais ambientes da vida pessoal;
a lógica inversa também é verdadeira, levamos para o trabalho os reflexos de nossa particularidade.
Gilson Aguiar

Introdução

Ao agirmos, é essencial compreender o peso da ação. Sim, comportamento tem peso. O que fazemos repercute na vida dos outros, traz consequências. Quando se toma uma decisão, de adotar um comportamento ou não, agir, reagir ou não, isso produz um resultado. Estamos, de certo modo, desenhando nossa percepção ao mundo, colocando nossa “assinatura” nas coisas. Somos, e muito, os atos. Neles, há uma expressão de nós.

Tomar cuidado com o comportamento é crucial. Entender que nossas atitudes expressam nossos interesses, idem. Então, saber quais são nossos interesses quando agimos, nos relacionamos, ganha importância. O porquê de fazemos certas coisas. O que desejamos ao assumir uma postura, ao expressar a opinião, ao não reagir ou reagir a uma questão, ou ação que nos envolve.

Nesse sentido é que repousa o que chamamos de “ética”. Quase sempre, e não de maneira equivocada, confundida com a “moral”. Ambas têm origem semelhante, mas se diferenciaram ao longo do tempo. A moral acaba por ser o valor coletivo e a ética, o sentido particular da ação. Vamos entender melhor essa diferença durante o curso.

O que nos interessa aqui é a conduta do “líder”. Entendo que a liderança tem diferentes sentidos e funções. O comando sobre um grupo de pessoas vai além da formalidade, da legalidade da condição de comando. Há os cargos que são descritos nos organogramas das empresas, aqueles que estabelecem de modo racional as funções de um “chefe”, diretor, gestor, coordenador, orientador... enfim, uma gama imensa de funções que implicam liderança.

Queremos aqui demonstrar o quanto é imprescindível ter uma liderança fundada na ética. Como o exercício do “poder”, seja ele em que dimensão for, precisa ser orientado por valores. As decisões de um líder impactam a vida das pessoas que ele comanda. Atitudes são marcas que vão além do ato, transformam-se em uma identificação da empresa por intermédio das atitudes do gestor. Por isso, entre outras coisas, queremos demonstrar que gestão não é liderança. Para que isso ocorra, tem de haver um sentido ético no comportamento de quem está à frente de pessoas.

Ética não é Moral

Por mais que elas se originem de um mesmo princípio.

A origem da moral e da ética repousa na antiguidade clássica. Gregos e romanos já lidavam com a compreensão dos valores que norteiam a sociedade. Para os gregos, a palavra ética, ou ethos em seu termo, estabelece que vivemos subordinados a uma lógica universal. Esta orienta a ação de todas as coisas. Assim, um ser humano dotado de ética sabe exercer seu papel neste universo. A sociedade deve buscar o funcionamento perfeito com o aprimoramento de suas partes. Saber qual é o nosso papel e agir para desempenhá-lo adequadamente é ético.

Para os romanos, a palavra moral vem de morus. A perfeição da vida está no cumprimento das funções esperadas. É primordial seguir a conduta que nos foi designada. O bom pai de família deve saber administrar seus filhos, esposa e patrimônio. Sua conduta deve ser educadora de acordo com os valores que a sociedade espera no cumprimento de sua função. O homem romano é ético tendo em vista que abre mão de seus interesses pessoais para submeter-se ao que sua função exige.

REFLITA

Você já se imaginou diante de uma decisão a ser tomada que vá de encontro aos seus interesses e, contraditoriamente, seja uma exigência da função que exerce? Imagine um pai de família, na busca do sustento de seus filhos, quantas vezes abre mão de seu interesse pessoal para poder atender a uma necessidade dos membros de sua família. Isso é o que se espera do “bom pai”, é a ação necessária à sua função.

As coisas mudam...

Vale ressaltar que moral e ética não são permanentes. O que se espera e o que se faz orientado em valores não são permanentes. Aquilo que se tinha como valor fundamental para os seres de uma determinada sociedade na antiguidade e na época medieval não existe mais em nossos dias. Isso para dar um exemplo exagerado, pois mesmo valores de cinquenta anos atrás não são mais considerados importantes hoje.

Como vivemos em uma sociedade de rápidas transformações na maneira como as relações sociais são estabelecidas, há uma tendência de mudança nos valores éticos e morais. Se pensarmos nas possibilidades que a internet trouxe para nossas vidas, o modo como nos aproximamos das pessoas, nos relacionamos, há uma propensão a mudanças no que consideramos moral ou ético.

A todo o momento, é possível rever comportamentos que consideramos de valor e fundamento das nossas condutas. Essas mudanças ocorrem à medida que a sociedade passa a dispor de relações que não reafirmam os valores existentes e apontam para novos meios de compreensão do sentido da vida humana. Se levarmos em conta o avanço da engenharia genética e o quanto isso pode alternar nossa compreensão do que é a capacidade humana de criar e gerar vida, muito do que acreditamos pode ser alterado.

Em nossa vida temos de estar cientes dessa mudança dos valores e, logo, do que é moralmente ou eticamente correto. O que se espera de nosso comportamento pode sofrer alternações ao longo do tempo. Em um ambiente social como o que temos na atualidade, com a multiplicidade de culturas, de diversidade de comportamentos e valores, isto precisa ser considerado.

Fonte: rawpixel / 123RF.

Nas empresas, assim como nos ambientes particulares, a diversidade é uma possibilidade constante. Conviver com pessoas das mais variadas culturas e crenças em relação a inúmeros conceitos faz parte do dia a dia. O líder deve saber conduzir essa mudança. Saber tratar com ética e entender que o outro não obedece aos mesmos critérios de valor. Um mapeamento desses valores, a compreensão do que estimula a conduta do “outro” ser humano é condição fundamental.

Ainda há sérios prejuízos aos empreendimentos ocasionados pela dificuldade de aliar uma conduta ética que seja capaz de compreender essa diversidade. A própria empresa tem um posicionamento no mercado e está sujeita à avaliação do público. Uma marca carrega consigo valores e se posiciona diante de temas que reafirmam ou não determinados princípios. Isso pode aproximar ou afastar clientes e consumidores. Um tema relevante para uma empresa pensar, e condição indispensável para seus gestores refletirem.

Introdução
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A Diferença entre Moral e Ética

Quando falamos em moral, estamos diante de um valor cultuado coletivamente, aquilo que se consolida como identidade comum. Um acordo de postura que de certo modo nos une diante de determinadas situações ou condições que acabam em um classificador social. Também estabelece um princípio comum de que se espera a ação de todos. Uma legitimidade informal que respalda determinadas condutas e dá origem a prejulgamentos associativos.

Quantas vezes não fazemos prejulgamento das pessoas? Por quanto tempo não cultuamos certos princípios e idolatramos condutas? Estamos a todo momento associando princípios como maneira de nos aproximar ou nos afastar de pessoas, lugares, apoio ou aceitação a determinados fatos. Isso faz parte da condição moral que norteia a sociedade e cria um grau de pertencimento e rejeição.

Fonte: ra2studio / 123RF.

A ética já está centrada na conduta particular, no valor que direciona o ato de cada um. Ela é o meio como a racionalidade define a sequência de atos e suas consequências nas relações que estabelecemos. Possibilita uma cadeia de elementos de importância para que justifiquemos na particularidade a ação necessária.

Lembramos que a conduta ética e o valor moral estão associados às emoções motivadas pelo sentimento que os valores reforçam. Expectativas, elogios, indiferença, afeto, pertencimento ou rejeição suscitam estados emocionais e estão ligados a valores morais e condutas éticas.

REFLITA

Quando falamos de emoção, é necessário considerar que a produtividade das empresas depende, e muito, do estado emocional dos funcionários. A valorização do ambiente de trabalho está diretamente relacionada ao sentimento de inclusão ou rejeição que ele provoca. Sabemos que não é o rendimento um fator determinante de satisfação no trabalho. A qualidade de vida, a condição afetiva e o reconhecimento são determinantes para a eficiência no ambiente de trabalho.

Em uma empresa, há inúmeras ações e reações que determinam os valores práticos que se preserva. Esses valores estão relacionados diretamente com a moral e a ética. Tal condição, por sua vez, é um dos componentes da cultura empresarial. Em qualquer ambiente de convivência de um grupo de pessoas, seja qual for sua dimensão, criam-se identificações com valores. Constrói-se uma identidade dentro da organização. É nesse ambiente que a presença ou a falta de um comportamento ético pode prejudicar a produtividade e a imagem da empresa.

É possível ter um comportamento ético?

A sociedade atual vive uma contradição entre a valorização da particularidade e o empobrecimento das relações. Estamos voltados aos nossos interesses como necessidades absolutas. Nessa condição, a presença, o conhecimento e o respeito aos outros se reduzem ou desaparecem. Não por acaso, as agressões aumentam. Mas, no fim, somos nós mesmos que estamos sendo violentados. Não há convivência sem valores. São eles que devem orientar a nossa ação.

Um dos públicos que mais sofre com as mudanças atuais são as mulheres. Elas representam a maioria dos provedores nas famílias brasileiras. Segundo levantamento da pesquisa Retratos da Desigualdade de Gênero e Raça, do Instituto Econômico de Pesquisa Aplicada (Ipea), com números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), as mulheres saltaram de 25% da liderança dos lares urbanos, em 1995, para 43%, em 2015. Essa condição, porém, não vem acompanhada de reconhecimento e valor.

Fonte: Aleksandr Davydov / 123RF.

Como podemos rever nosso modo de conduta sem cair no extremismo das rupturas? Esse é o grande dilema. Por isso, entender a ética e o conceito moral da sociedade é fundamental. Contudo, compreender as mudanças que necessitam de um reposicionamento de nossas posturas e os valores que as sustentam também é essencial.

Um líder deve preocupar-se com seu comportamento diante dos seus liderados e saber as consequências da ação que pratica e como ela vai repercutir na vida das pessoas com quem se relaciona, tanto na vida dos subordinados diretos como nos demais membros da empresa. A liderança é avaliada pelos seus pares também. Ela é medida por parceiros, pelas empresas associadas que são fornecedores ou consumidores de produtos e serviços, pelos clientes diretos e pela população de maneira geral.

REFLITA

Observe que nossos comportamentos acabam por despertar nas pessoas um “julgamento” a nosso respeito. Alguns desses julgamentos são precários, limitados. Outros têm a possibilidade de afetar diretamente a relação com o mercado. Quando falamos em “mercado”, estamos falando em potenciais parceiros, fornecedores e consumidores. Seres humanos que associam o que desejam aos valores que defendem, que consideram justos e que inspiram seus comportamentos.

Ética então é...

O sentido da ação que se mede pela preocupação com o resultado do comportamento. Está no estabelecimento claro de qual é nossa intenção com a ação. Uma associação entre o que se faz necessário e como se consegue atingir essa necessidade diante das condições que se detém, das pessoas com quem se convive, respeitando os seres humanos e suas particularidades e, ao mesmo tempo, não deixando de levar em conta o fator primordial da relação que nos une. Uma empresa necessita de produtividade; para isso, necessita de pessoas. Como tirar o máximo de produtividade fazendo com que as pessoas se realizem e se sintam respeitadas naquilo que estão fazendo? Esse é o dilema da ética dentro das empresas.

Preciso que as pessoas tenham uma ação produtiva, mas elas são singulares, diferentes, como indivíduos. Ao mesmo tempo que estão juntas, se relacionando, dentro de uma empresa, tenho de respeitar e fazer convergir os interesses de cada um no bem comum. Empresas querem resultados, mas precisam de pessoas para isso.

Não é fácil para a liderança equacionar todas as variáveis que os seres humanos sob seu comando podem oferecer. Temos de ficar atentos e nos aproximar daqueles que lideramos. Entendê-los dentro do ambiente do trabalho e conhecer minimamente suas condutas na vida pessoal, nos valores particulares. Em muitos casos, o sucesso ou não de um projeto, da execução de uma atividade em conjunto, depende da integração de pessoas diferentes. Cabe ao líder fazer essa ponte, essa integração.

Uma decisão a ser tomada, um meio de se relacionar, a maneira como nos comportamos minimamente no ambiente de trabalho contam, estão pautados em valores. Se cumprimentamos as pessoas ao chegar na empresa, se somos capazes de ouvir mais do que falar, se medimos e refletimos sobre o que falamos, tudo isso deve estar orientado por valores éticos.

Fonte: ammentorp / 123RF.

A impulsividade pode ser um problema na vida profissional. Agir pelo instinto e considerar que todos vão compreender e aceitar seus valores, conceitos, “crenças”, é uma percepção superficial das relações e das pessoas com quem nos relacionamos. Quando assumimos uma função, seja qual for o grau que ela ocupe em uma hierarquia organizacional, é necessário ter ponderação, compreensão e consciência dos efeitos que se promove ao se deixar levar pelo impulso ou pela banalização.

Um bom exemplo dessa condição é Sêneca, o senador e filósofo romano. Ele viveu na antiguidade e foi um dos exemplos do pensamento estoico. Para ele, o homem sabe discernir entre o “bem” e o “mal”. Independentemente das leis, há a consciência. Todo ser que se mostra maduro é porque já pecou, errou. Logo, o homem ético tem dor de consciência. Sabe que está cometendo um ato injusto. Portanto, sua ação deve sempre estar em busca da perfeição do ato na busca da execução do que é justo.

Para ele, no exercício da função é que aprendemos a controlar nossos instintos. Renunciamos aos nossos interesses pessoais para cumprir o que nosso cargo, nosso papel social, exige. Deve-se dar o exemplo para exigir exemplo. A liderança é exatamente essa renúncia da ambição particular em nome de uma função que vai além de nossas vontades pessoais. O líder renuncia a si para ser líder e se mantém como tal por saber agir em relação aos que lidera.

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Como se Constroem os Valores Éticos?

O termo “absoluto”, aqui utilizado, diz respeito a um valor que consolidamos como inquestionável. Aquele sobre o qual não há qualquer possibilidade de dúvida de sua veracidade, justiça e legitimidade. Muitas vezes, acreditamos e provocamos preconceito por termos essa condição de crença. Agimos em defesa de certos valores que podem estar desatualizados em relação à nossa sociedade e às pessoas com quem nos conectamos.

Acreditamos que certos conceitos são naturais porque são aceitos por todos, fazem parte da conduta de qualquer ser humano, uma “normalidade” perigosa.

Quando falarmos em heranças de valor, considere o quanto nossa formação familiar nos influenciou e a quantidade de conceitos que nos foram colocados como orientadores da boa ação. Muitos destes nos ajudam até hoje em nossa conduta, pois ainda são respeitados e considerados necessários. Muitos outros, porém, acabam nos colocando medidas preconceituosas em relação a outras pessoas. Perceba que, diante de certas situações, temos uma tendência a “generalizar”, o que pode ser prejudicial para quem assume um cargo de liderança e precisa conviver com “diferenças”.

Lembre-se de que, como dito anteriormente, há uma mudança da moral e da ética no decorrer do tempo. Não se defende as mesmas coisas, valores, conceitos e sentidos que se defendia há séculos e mesmo há décadas.

Se não percebermos que nossos valores estão desatualizados, podemos cometer atos que causem danos à nossa imagem e prejudiquem nossas relações para aquilo que consideramos necessário racionalmente, mas para os quais nossos conceitos não estão adequados.

Condição presente...

Temos de ficar atentos à condição presente. Onde estamos e quais são as relações que estamos estabelecendo hoje. O que herdamos em confronto com o que necessitamos ou convivemos. Um valor adquirido no passado pode estar desatualizado. Aquilo que tomamos como verdade se depara com outras pessoas com valores distintos e com as quais temos de nos relacionar. Logo, o dilema ocorre. Ficamos com nossos valores? Como convivemos com pessoas com valores diferentes? Diversidade de valores significa oposição?

Por isso, na condição em que estamos, a racionalidade ganha destaque. A compreensão lógica e ampla do que devemos e temos de fazer. No que consideramos como princípios éticos fundamentais, as três questões que norteiam o comportamento ético são:

Quero?

Muito do que fazemos não condiz com nossa vontade. Sentimo-nos pressionados a certos comportamentos que nem sempre desejamos realizar. Saber distinguir o que se quer ou não é elemento crucial para uma ação consciente.

Devo?

Aqui entra a condição principal das consequências da ação. Os resultados que ela produz. O que se perde ou se ganha com a ação. Aquilo que se espera de nós ou dos outros. As obrigações que devo cumprir ou não com minha ação ou não ação.

Posso?

Tenho condição de executá-la? É isso o que esperam de mim? Há condição de função, material ou moral para a ação? Tenho poder para isso? Estar no controle da ação é fundamental. Ansiamos por ter a rédea de nossa vida em nossas mãos. Mas ter o poder de decidir, de agir, implica outras duas questões anteriores.

Por isso, apesar de nossos valores herdados, a condição presente é elementar para direcionarmos nossa ação. Ela nos fornece o ambiente onde podemos refletir sobre a profundidade dos valores morais que temos, da condição racional que vivemos e do sentido da ação que desejamos. Esses elementos é que orientam o comportamento em busca do resultado desejado ou de um resultado que se deseja evitar.

Sentido futuro da ação...

Fonte: Daniil Peshkov / 123RF.

Aonde quero chegar com minhas atitudes? O que pretendo alcançar com a ação e os resultados que ela vai acarretar determina o valor da ação. Ela vai me proporcionar resultados imediatos? Vai garantir aquilo que desejo na condição momentânea? Quanto mais imediata é a busca de resultado, mais pobre é a ação em relação ao valor futuro, ao sentido. Quando estamos mais interessados em responder a instintos, ao agora, temos uma definição limitada de futuro.

Nessa condição de sentido futuro é que se diferencia significativamente o gestor do líder. A grande maioria dos que estão à frente de pessoas em um cargo de liderança dentro de um ambiente corporativo pratica a gestão, aquilo que é necessário no dia a dia. Poucos são os que têm um planejamento fundado em um sentido de longa duração e com a busca de resultados também de longo prazo. Não há uma percepção de comportamento que promova resultados amplos e com resultado prolongado.

Muito da insegurança do ambiente corporativo vem dessa falta de ver as consequências dos atos de maneira mais ampla. Mesmo diante das incertezas do mercado e dos imprevistos, há quem possa falar que não se leva em consideração a volatilidade da economia. Vivemos momentos de estabilidade, mas também de crise. Ações imediatas são necessárias, claro, mas não podem ser o sentido constante do comportamento da liderança.

Quanto mais sólida a decisão sustentada em uma análise racional, mas também sustentada no respeito à diversidade, levando em conta as capacidades humanas e o momento que se vive na construção de um relacionamento ético, maior a durabilidade do que se faz e dos resultados da ação. Diante da crise, escolhe-se a segurança; empresas éticas tendem a ser mais seguras.

Pior do que uma crise econômica é uma crise de pessoas ou pessoas em crise.
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Liderança: Origens, Faces e Condições

Chegar ao poder é um desafio, mas, como afirma Nicolau Maquiavel − pai da ciência política e autor do clássico livro sobre o poder, “O Príncipe” −, chegar ao poder não é mais difícil que mantê-lo. Para o pensador italiano do século XVI, o principal objetivo de quem chega ao poder é manter-se no poder, o que não é uma tarefa simples.

Torna-se importante entender a origem do poder, como se chegou a ele. Isso nos dá uma dimensão do desafio de manter-se. Não se nega que a chegada a um cargo de liderança pode se transformar apenas em gestão. Mas, se tivermos a capacidade de compreender a dimensão de nossa função e de nossos atos, de entendermos quem lideramos, podemos ser líderes de fato.

Para entendermos a condição da liderança vamos delimitar três condições de poder, três meios de estabelecer a chegada a um cargo de comando:

  • Liderança por herança.
  • Liderança por condição.
  • Liderança por sentido e carisma.

Por mais que aqui vamos descrevê-las em separado, elas acontecem muitas vezes me conjunto, se confundem, podem estar em uma mesma condição de poder. O que vamos fazer ao descrevê-las separadamente é facilitar o seu entendimento, sua detecção, para uma melhor compreensão e execução.

Liderança por herança...

Há duas maneiras de compreender a liderança aqui. Aquela que se herda literalmente, típica de empresas familiares, nas quais há sucessão, como também a liderança que se carrega de valores estabelecidos pelo líder que o antecede. Nosso modo de compreendermos que a continuidade do que se faz é a melhor escolha para o que se deve fazer, o que se convencionou muitas vezes chamar de tradição.

No ambiente de trabalho, os comportamentos assumidos por um líder podem ser resultado dos hábitos adquiridos na cultura da empresa. Mesmo no caso de um sentimento de ameaça, uma busca de afirmação pode estar por trás do comportamento do gestor. É algo que não se fundamenta na racionalidade, principalmente.

Em ambientes assim, a repressão acaba por se tornar o principal ponto de sustentação do mando. Cria nos porões da corporação um sentimento de raiva, o desejo de vingança, a vontade de ver fracassar as ações de produção e a própria empresa em si. Os que podem sair não pensam duas vezes, saem. Às vezes por propostas pouco tentadoras, apenas para livrar-se do fardo da convivência.

Se no passado essa prática foi eficiente, não traz qualquer sentido na atualidade. Não se acham mais pessoas sequestradas por muito tempo pelo temor do desemprego. Aquele que se sente molestado arruma um jeito de romper com a moléstia. Há inúmeras relações nas quais ele está vinculado dentro e fora do ambiente organizacional, na qual pode romper o vínculo de subordinação. Na nossa vida, mesmo pessoal, queremos manter certos discursos que eram facilmente justificados no passado. Isso nos desgasta e nos desclassifica como opção no presente. Herdar o poder tradicional pode colocar-nos no comando, mas não nos mantém por muito tempo se não mudarmos nossa maneira de compreender o presente.

A liderança ética, mesmo que herdada por tradição, sabe refazer seus conceitos e compreender a necessidade da mudança. Não rompe com aquilo que se herda e se mantém como eficiência, mas existe flexibilidade e resiliência para entender a diversidade e a necessidade de mudança, quando necessária.

O problema da ética na sucessão...

Mesmo nas empresas familiares, em que o poder é herdado, não se pode negar a influência da tradição. Se herdou o comando por ser filho(a) do proprietário(a), ou se está no comando não por mérito, há o hábito de se apegar aos valores tradicionais para sustentar-se. Esse fator resulta aos subordinados uma predisposição se considerado que o comando está nas mãos de alguém ineficiente. Se aqueles que desejam preparar seus filhos para a herança do poder soubessem que já nas primeiras relações da família com a empresa são construídos os valores que se preserva, muito disso poderia estar superado. O líder é reconhecido por respeito à função.

Há empresas familiares em que os proprietários sentem um prazer imenso em associar o empreendimento a uma extensão de sua casa, de seu mando, de sua vida doméstica. Um erro na conduta ética do negócio. Os princípios e os valores que a família cultua se estendem à empresa, o que nem sempre é benéfico porque depende de como se prática a ação administrativa. Deve se entender a relação que a própria família estabelece entre seus membros e o quanto isso afeta os negócios. Por isso, é preciso preparar toda a família para a sucessão e não exclusivamente aquele que vai administrar o empreendimento.

O que uma família preserva em matéria de valor moral pode ser maléfico na condução ética do empreendimento, das pessoas. Os colaboradores da empresa se inspiram naquilo que os membros familiares praticam. Liderança também é modelo além da racionalidade, modo de trabalho, da vida profissional. Dependendo da ação particular que venha ao conhecimento dos envolvidos no empreendimento, há a possibilidade de reforço ou não de uma conduta necessária.

Exemplo

Uma ruptura conjugal do líder da empresa pode transformar-se em “assunto” no ambiente empresarial. Por mais que se tenha uma compreensão de que a vida privada do gestor não é nem deve ser meio de avaliação de sua conduta profissional, isso pode ocorrer. Saber separar a condição da vida privada da profissional cabe tanto no trato das questões dos liderados como do líder. No entanto, a empresa deve ter capacidade de cultuar o respeito e garantir a privacidade. A liderança tem peso ético ao saber conduzir esse tipo de fato.

A preocupação de colocar membros familiares em postos da empresa implica uma relação delicada na condução ética do comando. A maneira como será tratado o desempenho daquele que está sendo preparado para a liderança está no comportamento que terá e no modo de exercer qualquer cargo na corporação. Sua conduta, mais do que a de qualquer outro colaborador, terá peso maior na avaliação das pessoas.

A liderança por herança tem seus percalços. Muitos questionam a eficiência quando ela não é o fator determinante para justificar a ascensão ao comando. A conduta de mostrar-se eficiente é a de também entender esse contexto. É preciso saber afirmar-se como herdeiro e merecedor da função. A resiliência é fundamental nessa condição, e é isso o que vamos tratar mais à frente.

Quem herda o poder, a liderança, deve preparar-se para compreender o presente em que vive, conhecer o perfil dos liderados, saber como se relacionar com disposição a romper hábitos nocivos e estimular permanências produtivas. Saber lidar de maneira diferente com o que se mantinha como condição ultrapassada de relacionamento, mas sem colocar em risco o respeito constituído e que herdou.

De repente você se vê em um cargo de liderança. Necessita assumir um posto vago, foi escolhido para o comando por mérito. A condição exige agora que você administre pessoas. E só podemos administrar aquilo que conhecemos. O desafio, contudo, é conhecer a si mesmo. Nada antecede tanto o comando como o autoconhecimento. Esse é um exercício que o líder por condição deve praticar.

Em que você acredita como valores pessoais e profissionais? Aonde deseja chegar em uma carreira cuja liderança faz parte do seu currículo? Quais são as eficiências e deficiências na postura que se assume diante de um cargo de liderança? Essas questões devem ser respondidas antes e durante o exercício da liderança. Questionar as próprias posturas, reaprender a agir quando se busca um resultado em determinadas condições e se percebe que a avaliação que se fez do ambiente e das relações não estava correta.

Um dos problemas comuns de quem exerce a liderança por condição é não aceitar que erros devem ser admitidos. Fazer uma reflexão constante do trabalho que se executa e incorporar a necessidade de uma mudança de valores e ações é vital para o sucesso. Liderança não significa perfeição, mas constante transformação por meio de um exercício constante de agir, ver resultados e repensar a ação.

Ter uma ação ética não é decretar sentenças. Mas saber que se deseja atingir um resultado em relação às pessoas e ao que se propõe com elas, o que se busca em conjunto com os demais. Esse é um contexto de mudança. Pessoas são diferentes e estão em um ambiente de trabalho por motivos diferentes, estimuladas pelas mais variadas intenções.

Também podemos considerar como liderança aquela que não é formalizada. A que não está legitimada por nenhum estatuto ou cronograma da empresa. Aquela que se assume na relação com os demais na busca de cumprir uma tarefa em conjunto. Às vezes, pessoas que desempenham uma mesma função e trabalham com dependência mútua acabam por eleger um líder que chamamos aqui de “informal”. Essa também é uma liderança por condição.

Não podemos deixar de considerar que o meio de conduta desse líder “casual” tem relevância dentro das organizações. Mesmo sem assumir a função ele cumpre o comando pela habilidade, pela experiência e pela tendência pessoal de proatividade. É por iniciativa dele que muitas das coisas imediatas e cotidianas se resolvem. Este tem de se pautar em uma ética pela própria condição de liderança que exerce. Ele não é designado, emerge da relação prática, ganha o respeito e é reconhecido pelos seus pares. Muitos desses líderes que chamamos de orgânicos acabam por se tornar líderes de sentido futuro e de identificação carismática.

O comportamento desse líder ocasional, orgânico, se transforma em modelo e estimula as ações dos que com ele se relacionam. Ele acaba por influenciar mais a equipe de trabalho do que um líder designado e que está no organograma da empresa. Aquele que é racionalmente definido pela função. O comando ocasional, que emerge da relação, influencia a própria avaliação e o respeito das demais lideranças formalmente estabelecidas.

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